Estar diante de um palco
e conduzir um espetáculo para o público é uma experiência transformadora, não
somente para os atores e a plateia mas, também, para toda a sociedade.
Desde os primórdios da
dramaturgia, com as primeiras manifestações do Teatro Grego, o público já
encontrava um caráter crítico e de denúncia social nas peças apresentadas,
mesmo que as encenações fossem centradas nos gêneros: tragédia, sátira ou
comédia.
Entre os grandes nomes da
arte dramática na Grécia Antiga, se destaca Aristófanes, que em sua comédia
trouxe temas pertinentes como os conflitos entre as zonas urbana e rural, a
corrupção dos políticos, a efervescência causada pelo comércio e muitos outros
assuntos ligados ao cotidiano da época. Já Ésquilo - outro dramaturgo grego de sólido
trabalho - não deixou de lado o viés político de seus textos, que sempre
refletiam as mudanças políticas que aconteciam na Grécia.
E, mesmo com a
transformação da arte dramática ao longo dos séculos, o caráter crítico de
análise humana e social se manteve. O Teatro Moderno, por exemplo, absorveu o
movimento realista para criar peças que retratam o cotidiano humano, levando em
conta os problemas sociais e também inserindo temas polêmicos nos espetáculos.
Um dos grandes representantes dessa nova dramaturgia foi o norueguês Henrik
Ibsen, que marcou o século 19 com suas histórias que exploraram o íntimo do ser
humano em conflito com o que a sociedade espera do mesmo.
“A dramaturgia cumpre, seja pelo riso, pelo choro, pela comédia, tragédia, drama, um papel essencial na transformação social, na medida em que nos convida a reflexões, questionamentos, catarses, gerando também, nesse processo, transformações individuais. Isso ocorre na concepção de teatro enquanto letra impressa, em forma de livro, porém ganha ainda mais vulto na vertente cênica, em que há exposição mais impactante de nossa condição humana”, explica o escritor Valdir de Aquino Ximenes quando questionado sobre como a dramaturgia revolucionou a sociedade ao longo do tempo.
Em “A solidão do poderoso
no espelho”, nova obra de Valdir, acompanhamos como protagonista um presidente
em estado de crise, que no decorrer do texto dramático faz uma reflexão de suas
atitudes ao longo do mandato. Após uma pandemia afetar o país que governa, a
responsabilidade das vidas perdidas escorre pelas suas mãos e ele entra em uma
viagem interna com elementos do Teatro do Absurdo, entre alucinações e
conversas com espelhos.
A trama compreende
grandes questões atuais que muitos países viveram e vivem em decorrência da
pandemia pelo coronavírus, mas joga com a possibilidade de se passar em
qualquer lugar do mundo.
“Vivemos um período tenebroso da história humana no mundo todo, e em particular no nosso país temos a sensação de estarmos sendo impulsionados cruelmente para um prédio em chamas. Mas na peça não há fulanização explícita de pessoas, países, nem mesmo do vírus. Pretendi dar a ela um caráter atemporal, ubíquo, e a sua essência temática, a apologia da democracia, cabe em qualquer época ou país”, observa Ximenes.
A inspiração para
escrever a peça em questão surgiu da ebulição de sentimentos e questionamentos
impostos pela nova realidade pandêmica e se utilizou da atualidade como
combustível para a criação artística:
“Vivemos em um país em que se morre de todas as formas possíveis, menos de tédio. Logo no início da pandemia me vi forçado, como todo mundo, a uma reclusão caseira, ainda que parcial, devido à minha condição de médico. Então, para me atualizar, comecei a ler mais jornais e acompanhar diariamente o noticiário televisivo tóxico. Muitos preferiram a alienação como forma de preservação psíquica. Eu preferi canalizar para a literatura. Daí surgiu a peça, abastecida da mórbida matéria-prima cotidiana”, revela Valdir sobre seu processo criativo.
Os assuntos abordados
pelos dramaturgos vão se alterando com o passar das décadas e a dramaturgia
ganha novos respiros e se adequa a novas roupagens para cumprir seu papel
transformador. Ximenes acredita que essas modificações na Dramaturgia acontecem
sem perder a essência principal da arte:
“Incorporando novos temas, linguagens e recursos tecnológicos, acompanhando a evolução da sociedade nesse sentido, até mesmo como estratégia para angariar o interesse do público infanto-juvenil, cada vez mais refém e cativo das telas e teclados. Mas o teatro não poderá nunca prescindir da importância dos atores e de uma narrativa bem contada, para cumprir o seu papel enquanto veículo artístico a expressar as eternas demandas humanas. ”
“A solidão do poderoso no
espelho” contará com lançamento on-line no dia 10 de
fevereiro (quarta-feira), com a presença de Valdir Ximenes! Os ingressos
para o evento são vendidos através da plataforma Sympla e na compra do
ingresso, além do encontro com o autor, um exemplar do livro será enviado ao
endereço cadastrado.
Para os futuros
dramaturgos, Valdir aconselha a ler bastante teatro, teoria e prática, além de
assistir a muitas peças e filmes. Porém, o recado mais importante ele deixou
por último, que é se manter fiel ao fazer teatral e sempre ter em mente seu
potencial transformador:
“Estar atento às linguagens, tecnologias e temas contemporâneos, sem nunca perder de vista, como um farol da criação artística, a função precípua do fazer teatral: refletir e transformar para melhor a mente e o espírito do homem”, finaliza o autor.
A
seguir, saiba mais sobre os livros citados na matéria:
Aristófanes - o dramaturgo da cidade justa, de Ana Maria César Pompeu
Ésquilo - o dramaturgo guerreiro, de Marcus Mota
Henrik Ibsen - o pai do drama moderno, de Paulo Ricardo Berton
A solidão do poderoso no espelho, de Valdir de Aquino Ximenes